O jazz nunca soou tão vivo Em 1964, John Coltrane já caminhava para um lugar onde poucos músicos chegam: aquele território raro onde técnica, espiritualidade e emoção se tornam uma coisa só. Crescent nasce desse momento — introspectivo, profundo, quase meditativo — e revela um Coltrane mais contido na superfície, mas incendiado por dentro. Aqui, ele não está sozinho. Está com o único time capaz de acompanhá-lo nessa travessia: McCoy Tyner, Jimmy Garrison e Elvin Jones, o “Classic Quartet” que virou lenda antes mesmo de perceber que era lenda. Juntos, eles constroem um disco de cinco faixas que parecem cinco estados de espírito. A jornada abre com a faixa-título, um sopro melancólico que se estende como uma prece. Depois vem “Wise One”, um encontro entre silêncio e luz — Coltrane conversando com o divino no sax. Em “Lonnie’s Lament”, a emoção sobe com força. É a faixa em que Jimmy Garrison toma a cena e entrega um dos solos mais marcantes do álbum, daqueles que você escuta e entende que o baixo também pode falar de perda, memória e cura. Por fim, “The Drum Thing” fecha com Elvin Jones conduzindo o disco para outro plano. São tambores que não tocam: convocam. Uma improvisação hipnótica que segura o ouvinte pelo pulso e só solta no final. Crescent é isso: um álbum para quem busca profundidade sonora, elegância atemporal e aquele tipo de experiência que a gente não escuta — a gente atravessa.